MPF denuncia empresários de MT que grilaram terras no Amapá e geraram dano de R$ 150 milhões
Conforme apurado pelo Olhar Jurídico, Daniela Sebben figura como sócia em várias empresas, sendo sócia-administradora de uma delas, que tem como objeto social a atividade de logística e transporte de cargas, a Modal Logística e Transporte Ltda, com sede em Cuiabá.
O Ministério Público Federal (MPF) acusa Daniel Sebben, ex-secretário de desenvolvimento rural do Amapá, de liderar esquema de grilagem de terras da União para cultivar soja. A denúncia atinge também outras nove pessoas, entre integrantes da família dele, empresários envolvidos com o agronegócio e funcionários públicos vinculados ao Instituto Nacional da Colonização e Reforma Agrária (Incra). Além dos crimes de organização criminosa, invasão de terras públicas da União, falsidade ideológica de documentos particulares e lavagem de imóveis, a peça cita a prática de corrupção ativa e passiva. Os danos resultantes dos ilícitos são estimados em R$ 150 milhões, cujo valor, se condenados, os envolvidos terão de ressarcir ao erário. Alguns dos citados tinham raízes em Mato Grosso.
A denúncia é fruto da 2ª fase da Operação Shoyu, deflagrada pela Polícia Federal em maio de 2020. Durante a 1ª fase da Operação, em 2019, o governo do Amapá acatou recomendação do MPF para exonerar Daniel Sebben do cargo público, sob o risco de o empresário, então ex-presidente da Associação dos Produtores de Soja (Aprosoja), influenciar em atos de gestão que pudessem lhe beneficiar diretamente.
Na 2ª fase, Daniel Sebben, a irmã dele, Daniela Sebben, a mulher, Carolina Sebben, e o sogro, Paulo Robson Carneiro Gondim, foram investigados por participar ativamente da regularização fraudulenta de 842 hectares desmembrados em três fazendas – Beira Rio, Esperança e Tainá. A área, pertencente à União, localizada na zona rural de Macapá, foi alienada a Sebben, em 2012, por R$ 1,4 milhão por pessoas que tentaram, sem sucesso, regularizar o imóvel
Para viabilizar a titulação criminosa da área, a família Sebben praticou uma série de fraudes documentais. Mesmo sendo empresários do ramo de construção e comércio varejista, em Mato Grosso, os membros da família se declaram como agricultores no Amapá, a fim de cumprir os requisitos da lei que estabelece o procedimento de regularização de terras da União na Amazônia Legal. Alegaram, ainda, residir em Macapá, quando, na verdade, os membros da família residiam em Mato Grosso ou em São Paulo, de onde administravam suas empresas. Além disso, uma série de documentos evidencia o desmembramento fraudulento da área em unidades menores e contíguas e seu registro de ocupação em datas não correspondentes à realidade.
Conforme apurado pelo Olhar Jurídico, Daniela Sebben figura como sócia em várias empresas, sendo sócia-administradora de uma delas, que tem como objeto social a atividade de logística e transporte de cargas, a Modal Logística e Transporte Ltda, com sede em Cuiabá.
Paulo Gondim consta como sócio-administrador e responsável pela empresa Gondim & Cia Ltda, com atuação no comércio varejista de materiais de construção em geral, e sócio-administrador da empresa Ideal Construtora Ltda, ambas localizadas no Município de Mirassol D’Oeste, em Mato Grosso.
Corrupção
O objetivo criminoso da família Sebben teve o apoio de Marcos Paulo Bertolo e Carlos Henrique Guilherme Ulchak, engenheiros agrimensores cadastrados no Incra. Esse último já responde a pelo menos 15 ações ajuizadas pelo MPF, todas relacionadas a processos de regularização fundiária fraudulentos. Para viabilizar os requerimentos de regularização fraudulentos, Bertolo e Ulchak registravam dados falsos no Sistema de Gestão Fundiária (Sigef). No sistema, são efetuados registros das informações georreferenciadas de limites de imóveis rurais públicos e privados por profissional habilitado e credenciado pelo Incra. Com acesso autorizado no Sigef, os engenheiros envolvidos no esquema inseriram planta e memorial descritivo das áreas como se fossem efetivamente ocupadas pelos interessados no tempo previsto em lei. Com os registros, era viabilizada também a obtenção de licenças ambientais e financiamentos para a exploração da área.
Outro integrante do esquema foi Luiz Guilherme Cavalcante de Melo, conhecido como Luluca, então chefe do Escritório de Regularização Fundiária no Amapá, do Programa Terra Legal/Incra. Para o MPF, não resta dúvida de que ele recebeu vantagens financeiras para influenciar nos processos de regularização fundiária em trâmite no órgão por ele chefiado. Em 2018, as fraudes perpetradas pela organização criminosa resultaram na titulação irregular das áreas em nome de Sebben e de seus familiares.
A articulação dos crimes perante os órgãos fundiários e ambientais do estado ficou a cargo de Celso Carlos Santos, que, na época, substituía Sebben na presidência da Aprosoja. Ele contava com o apoio de Érica Rossi, sócia de Carlos Henrique Ulchak na empresa Engex, que prestava serviços a empresários do ramo da soja no Amapá. Celso Carlos e Érica Rossi foram alvo da 1ª fase da Operação Shoyu e já são réus na ação penal resultante das investigações. Outro envolvido é Gilcimar Pureza, que se apresentava como presidente da Organização das Cooperativas Brasileiras no Amapá. Ele chegou a convocar assembleias e plenárias para tratar da regularização fundiária no estado com representantes do setor primário, por meio do Movimento Amapá que Produz. Junto à família Sebben, o trio era responsável por corromper o servidor Luiz Guilherme Cavalcante de Melo.
Trecho da peça menciona que, além de influir nas decisões tomadas nos órgãos ambientais do Amapá, a preocupação da organização criminosa era que os processos de regularização fundiária envolvendo terras do interesse de empresários da soja fossem finalizados. A influência da organização era utilizada para eliminar qualquer obstáculo que fosse posto à frente do objetivo do grupo: a implantação do cultivo de grãos em escala industrial no Amapá.
Na denúncia, o MPF pede que seja declarada a nulidade da titulação das fazendas Esperança, Tainá e Beira Rio por se tratarem de produto do crime, nos termos do art. 91, do Código Penal. Outro pedido é o ressarcimento do valor do dano ao erário, estimado em R$ 150 milhões. E, ainda, a condenação, de cada um dos denunciados, na medida de suas responsabilidades, a penas que vão de 6 meses a 12 anos de detenção ou reclusão, por crime, além de multas.
Fonte: Olhar Direto